“(...) O quadro se fora. Ele já representava algo perdido,
algo que eu jamais tivera, que jamais teria. Agora, mesmo aquela lembrança se
fora, e em volta dos pés de Papa estavam espalhados pedaços de papel pintados
de cores terrais. Os pedaços eram muito pequenos, muito precisos. De repente,
enlouquecidamente, imaginei o corpo de Papa-Nnukwu sendo cortado em pedaços
daquele tamnho e guardado numa geladeira.
- Não! – gritei.
Corri para os pedaços no chão como se quisesse salvá-los,
como se salvá-los fosse salvar Papa-Nnukwu. Atirei-me no chão, deitei sobre os
pedaços de papel.” p.222
A citação é imensa e confesso que minha vontade era encher o post de citações desse livro espetacular. Leitura de férias, preparação para participação do encontro #leiamulheres, esse foi o livro que preencheu meus dias e me fez refletir mesmo quando fazia coisas corriqueiras do dia-a-dia. Chimamanda, com sua escrita direta e reflexiva, deu voz a uma adolescente nigeriana, silenciosa, mas muito reflexiva.
Kambili é uma jovem de mais ou menos 15 anos (posso me
confundir nos detalhes), criada numa família nigeriana católica, tradicional e
muito rica. Seu Papa é um homem muito religioso e generoso, pronto para ajudar
a todos sem nada esperar em troca, nem elogios, mas dentro de casa cria seus
filhos e trata sua esposa a ferro e fogo (quase que literalmente), sempre com
base nos ensinamentos que recebeu dos jesuítas que “converteram” os nigerianos,
e essa identidade dúbia confundi o leitor e dificulta a própria compreensão de
quem é esse pai. Toda a história de Kambili começa a mudar quando é convidada,
juntamente com seu irmão Jaja, a passar algumas semanas na casa de sua tia
Ifeoma. Lá tanto Kambili como Jaja desabrocham e descobrem uma vida além
daquela que eles vivem, uma vida de sorrisos, opiniões e muito familiar. Na
companhia dos primos e do padre Amadi, Kambili vê sua vida ser transformada
pouco a pouco. Lá ela conhece um pouco de seu Papa-Nnukwu (com quem nem deveria
ter contato, já que seu pai a proibira, visto que seu avó era um pagão), e percebe
que o amor e a família estão além da religião.
Hibisco Roxo é de uma beleza e raridade (como a própria
flor) que encanta e seduz o leitor. Prendendo do começo ao fim, é uma trama com
reviravoltas surpreendentes e vários pontos de interrogação. Você termina a
leitura e permanece sentada, como Kambili, refletindo sobre tudo o que viveu
naquelas páginas.
Nota 10 para esse romance. Super indico.
Vanessa Reis